Os últimos
três anos foram os melhores da vida de Lisa; muita coisa mudou... O mundo
mudou. Novas tecnologias foram criadas, presidentes foram eleitos, o planeta
ganhou simbolicamente seu habitante de numero 7 bilhão, e agora Lisa bem mais
madura cursa o quinto semestre de pedagogia, duas vezes por semana a garota
realiza estágio numa instituição de nome Azul do vento, que atende crianças com
autismo. Tudo estava em perfeita harmonia exceto por uma coisa; recentemente a
avó de Lisa escorregou no banheiro e fez um pequeno ferimento na perna, a princípio
um simples ferimento, mas o sangue demorou a estancar, por conta disso dona
Charlotte foi levada ao hospital, e já com o sangue estancado a família de Lisa
foi sacudida por uma notícia triste, um diagnóstico parcial apontou que a avó
de Lisa poderia estar com leucemia.
Passado o
luto do primeiro impacto com a notícia, veio à luta e a esperança de cura da
doença, a avó de Lisa foi transferida para o hospital Saint Louis que é referência
no tratamento de pessoas com leucemia, somente lá eles poderiam dar um diagnóstico
mais preciso em relação à doença.
Enquanto
realizavam uma bateria de exames em dona Charlotte, os pais de Lisa juntamente
com algumas tias aguardavam noticias na sala de espera do hospital, mesmo
sabendo os riscos e a gravidade da doença, Lisa tentava demonstrar motivação e
otimismo a todos:
- Pessoal?
Mãe? Pai? Leucemia tem cura! O prognóstico de pessoas com leucemia na maioria
das vezes é positivo, basta que se encontre um doador de medula que seja
compatível com a vovó, e pronto. Nós temos que ser fortes agora, vamos aguardar
pelos exames e ver o que os médicos dirão.
Passado
alguns minutos, o médico entrou pela porta da sala de espera e noticiou a todos
o que havia sido feito com dona Charlotte, e quais os procedimentos seriam
adotados a partir dali:
- Boa
tarde! São parentes da paciente Charlotte Lane?
Dona Melanie
disse que sim!
- Bom...
Foi coletada uma pequena porção de sangue de dona Charlotte, e posteriormente
realizado uma contagem de plaquetas que indicou a produção de grande quantidade
de células brancas, que acabam enfraquecendo a produção das células vermelhas.
- E isso
significa o que doutor?
O médico
esfregando os olhos deu a notícia que ninguém queria ouvir:
-
Significa que o diagnóstico parcial de que dona Charlotte poderia estar com
leucemia, se confirmou em nossos exames.
Senhor
Sebastian, avô de Lisa ficou arrasado, depois se recuperou do impacto com a
notícia e pediu para que o médico explicasse o que seria feito a partir dali:
- A
leucemia tem cura, porém o processo para se chegar até ela é um pouco árduo,
dona Charlotte vai precisar urgentemente de um doador de medula óssea que seja
compatível, do contrário... Precisamos encontrar doadores em potencial como,
pai, mãe, irmãos, filhos...
Senhor
Sebastian questionou o médico:
- Eu posso
ser um doador?
- Sim! O
sucesso da compatibilidade se dá mais em nível de parentes consanguíneos, mas
podemos tentar sim.
Lisa
emendou:
- Netos
também podem?
- Também!
Quanto maior o número de pessoas maiores são as chances! Não o bastante eu
coloquei o nome de dona Charlotte no banco nacional de medula óssea, mas a
falta de informação faz com que esse banco de doadores seja muito limitado!
Mary; uma
das tias de Lisa questionou o médico:
-
Limitado? Como assim?
- Qualquer
pessoa pode ser um doador de medula óssea! Os doadores preenchem um formulário
com dados pessoais e é coletada uma amostra de sangue com 5 ml para testes.
Estes testes determinam as características genéticas que são necessárias para a
compatibilidade entre o doador e o paciente. Os dados pessoais e os resultados
dos testes são armazenados em um sistema informatizado que realiza o cruzamento
com dados dos pacientes que estão necessitando de um transplante. Em caso de
compatibilidade com um paciente, o doador é então chamado para exames
complementares e para realizar a doação. Tudo seria muito simples e fácil, se
não fosse o problema da compatibilidade entre as células do doador e do
receptor. A chance de encontrar uma medula compatível é, em média, de UMA EM
CEM MIL!
Senhor
Sebastian questionou o médico mais uma vez:
- E como é
feita a coleta da medula?
- A medula
é retirada do interior de ossos da bacia, por meio de punções, e se recompõe em
apenas 15 dias. Para o doador, a doação será apenas um incômodo passageiro.
Para o doente, será a diferença entre a vida e a morte.
- Entendi!
- Ah
pessoal! Uma última notícia! Infelizmente teremos que realizar em dona
Charlotte algumas seções de quimioterapia para o retardo da doença, com isso
vamos ganhar tempo até que encontremos um possível doador; eu sempre gosto de
ressaltar que é muito importante o apoio da família nesta hora, embora a
medicina não olhe com bons olhos a questão emocional, eu acredito muito que o
fator emocional possa ser um grande aliado na cura da doença; nos próximos dias
vamos agendar as coletas de sangue para os testes de compatibilidade. Por hoje
eu não aconselho visitas; dona Charlotte está um pouco sonolenta por conta da
bateria de exames da qual foi submetida, mas a partir de amanhã a vontade.
Dona
Melanie agradeceu ao médico por toda a atenção e informação dada à família:
- Doutor...
- Karl!
- Muito
obrigado!
- Não
precisam agradecer! Se precisarem de alguma coisa, estarei andando pelo
hospital, afinal são 2.400 pacientes.
Lisa
embora uma “criança” de 23 anos, assumiu o peso e a responsabilidade de ser a
estrutura emocional de toda a família, a garota virou uma espécie de guardiã,
contava os minutos para sair da universidade e poder correr até o hospital para
ficar junto a sua avó.
O hospital
Saint Louis, é o maior da cidade, tem diversas alas, dentre elas a de
tratamento de pessoas com leucemia. Junto com dona Charlotte no quarto, esta
uma garotinha de 4 aninhos que também vai iniciar o tratamento.
No dia
seguinte, Lisa saiu do estágio e correu para o hospital, afinal de contas era o
primeiro dia que a garota iria passar com sua avó, chegando ao hospital logo se
dirigiu para o complexo onde dona Charlotte estava internada. Ao entrar no
quarto, Lisa passeou o olho por todos os lugares, em seguida avistou a
garotinha que estava em um leito mais ao canto, junto à garotinha estava também
sua mãe, Lisa cumprimentou as duas e dirigiu-se a sua avó:
- Vó?
- Oi Lisa,
tudo bem?
- Sim, e a
senhora? Como dormiu?
- Eu dormi
bem! A vovó está bem! Sua mãe acabou de sair daqui!
- Eu
estava no estágio, por isso me atrasei!
Minutos
depois uma enfermeira adentrou o quarto em que Lisa, sua avó, a garotinha e sua
mãe estavam, o alvo era a pequena de 4 anos de idade, bastou ver a enfermeira
que a criança começou a chorar compulsivamente, sua mãe tentava acalma-la, porém
em vão.
Um garoto
chega para mais um dia de peregrinação; pelos corredores do hospital Saint
Louis ele não passa despercebido, os sapatos são duas vezes maiores que seu número,
as meias, uma verde a outra azul, calça xadrez, suspensórios, jaleco e uma
camisa listrada, no rosto uma leve sombra branca acima das sobrancelhas,
bochechas rosadas e no centro de sua face, a alma de um palhaço, o nariz
vermelho. Em uma de suas mãos, seu amigo inseparável, o Tchuco, uma centopeia
de pelúcia que acompanha o garoto. Na cabeça um chapéu de sapo, isso mesmo, um
chapéu de sapo, para os íntimos é o Crazy Frog.
Quem é
esse rapaz?
Respeitável
público, com vocês: Doga! (Risos)
Ao
adentrar a ala de pacientes com leucemia, ele ouve um choro lastimável que vem
de um dos quartos, o garoto segue em direção ao choro até sua origem...
Exatamente o quarto em que Lisa estava com sua avó. Doga entra em cena:
- Oras, Oras!
Estava ouvindo um choro que vinha deste quarto, pensei... Quem será?
Ao avistar
o palhaço a garotinha ainda ressabiada deixou escapar um sorriso:
- Por que
você está chorando?
- Por que
ela vai me dar uma injeção! Vai doer!
O palhaço
cochichou com a enfermeira:
-
Enfermeira? Posso tentar?
- Fique a
vontade!
Com Tchuco
em suas mãos, Doga puxou um diálogo amistoso com a garotinha:
- Fala seu
nome para mim?
- Lucy!
- Que nome
mais lindo Lucy!
-
Obrigada!
- Deixa eu
te contar um segredo...
O garoto
debruçou a cabeça perto de Lucy:
- Era uma
vez, uma família de vagalumes, tinha o papai vagalume, a mamãe vagalume e a
filhinha vagalume, você conhece vagalumes né?
- Aqueles
com lusinhas no bumbum?
- Isso!
Aqueles com lusinhas no bumbum! Um dia a filhinha vagalume ficou dodói, e você
acredita que a lusinha no bumbum parou de brilhar?
- Se
apagou?
- Sim!
- Por quê?
- Por que
ela estava dodói! Mas existe um jeito da lusinha voltar a brilhar!
- Como?
- Ela
precisa tomar um remedinho, é uma poção mágica que faz a lusinha acender de
novo!
- Se ela
tomar ela vai ficar bem?
- Vai sim!
Eu prometo! Por que você não deixa eu dar uma picadinha no seu braço?
- Vai
doer!
- Não vou
mentir para você, vai doer um pouquinho, mas eu prometo que vai ser rapidinho!
Você confia em mim!?
-
Confio...! Eu posso segurar a sua mão?
- Eu vou
estar com as mãos ocupadas, mas vamos combinar o seguinte, eu vou deixar o
Tchuco com você.
O garoto
pegou a centopeia e como um ventríloquo fez Tchuco entrar na conversa:
- Tchuco
eu preciso de você!
- “Pode
falar Doga”
- Eu
preciso que empreste uma de suas patinhas para a Lucy segurar enquanto eu dou
uma picadinha no braço dela, você me ajuda?
- “Claro
que ajudo! Lucy, eu tenho 100 patinhas, você pode segurar em qualquer uma
delas”!
A
garotinha deu uma “gravata” em Thuco e o colocou debaixo de seu braço esquerdo!
Feito isso, o palhaço pegou o cateter, e sem resistência atravessou a pele
sensível da pequena Lucy até encontrar uma de suas veias:
- Doeu?
- Um
pouquinho!
- Mas já
passou né?
- Sim!
- Algo me diz
que em breve a lusinha vai voltar a brilhar!
Antes de
deixar o leito de Lucy, o garoto enfiou a mão no bolso, tirou um nariz de
palhaço, e colocou no nariz da garotinha:
- Agora
você é igual a mim!
Lucy
soltou um largo e bonito sorriso:
- Fiquei
bonita?
- Você
ficou linda! Me promete uma coisa?
- Sim!
- Se
precisar tomar algum remédio até amanhã você toma?
- Mesmo se
for ruim?
- Mesmo se
for ruim!
- Esta bem
eu tomo!
O palhaço
prometeu voltar no dia seguinte:
- Eu prometo
voltar para te ver amanhã! Enquanto não chega amanhã, vou deixar um presente
para que você se lembre de mim; o palhaço tirou de um de seus bolsos do jaleco,
um cisne feito de origami e deu a garotinha. A mãe de Lucy ficou inerte:
- Você é
incrível!
O garoto
colocou as mãos no rosto da mãe de Lucy e disse:
- Sua
filha é incrível! Não sou eu quem está deitado nessa cama, e mesmo assim ainda
sorrindo!
Lisa ficou
paralisada olhando aquela cena, não acreditando muito no que estava vendo, a
garota estava encantada pelo palhaço. Em seguida o palhaço dirigiu-se para o
leito de dona Charlotte:
- Boa
tarde, tudo bem com senhora?
- Estou
ótima!
- Isso é
bom!
O garoto
segurou a mão de dona Charlotte, e quase que por osmose, passou toda força dele
a ela:
- A
senhora já realizou a primeira seção de quimioterapia?
- Ainda
não! Está marcado para logo mais a noite!
- Se
quiser eu volto aqui a noite para estar junto da senhora!
- Não
precisa meu anjo! Deve haver outras crianças que estão precisando mais que eu,
além do mais, eu tenho minha neta Lisa, muito obrigado mesmo assim!
-
Disponho!
O palhaço
tirou de seu bolso mais um cisne de papel e colocou em cima da mesinha ao lado
de dona Charlotte, em seguida brincando, o garoto pegou Tchuco e despediu-se de
todos no quarto:
- Tchau,
Tchau, Tchau!
- Fala
Tchau Tchuco!
- “Tchau
Lucy”?
- Tchau
Tchuco!
Ao
virar-se de costas para sair do quarto, Lisa olhou para os pés do garoto e viu
que ele usava meias de cores diferentes, a garota fechou os olhos e alguns
flashs passaram por sua cabeça, ao abrir os olhos ela viu estampado no jaleco
do garoto a seguinte frase:
“É muito simples ser importante na vida dos
outros.”
Lisa
pensou: “Essa frase não me é estranha”. Em seguida a garota voltou a fechar os
olhos na tentativa de buscar em algum lugar de sua memória as cenas perdidas.
Segundos depois vieram outros flashs; em preto e branco, meio desfocado, veio a
imagem da fila e o garoto a sua frente, em seguida a imagem dela e Miles
andando pelos corredores da universidade, quando por eles passa um maluco
usando meias de cores diferentes, Lisa abre os olhos rapidamente:
- É ele!
Dona
Charlotte:
- É ele
quem?
- Vó! Me
aguarda um minuto, eu já venho!
O palhaço
e seu fiel escudeiro estavam prestes a desaparecer no corredor, quando Lisa
chamou pelo garoto:
- Ei!
O palhaço
olhou para trás e Lisa emendou:
- Tem um
minuto?
- Claro!
Lisa se
aproximou do garoto:
- Estuda
na universidade Fredom?
- Sim!
Quinto semestre de medicina! Por quê?
- Eu não
sei bem ao certo por que estou te falando isso, mas é que... Eu já te vi por
lá! No dia da realização da matrícula, eu estava atrás de você na fila!
- Que
legal! Estuda o que lá?
- Quinto
semestre de pedagogia!
-
Desculpe, mas nunca te vi lá! Sabe como é... Nossa universidade é bastante
grande!
- Sem
problemas! Posso te fazer só mais uma pergunta?
- Claro!
- Eu ainda
estou impressionada com o que fez com a garotinha... Lucy né?
- Isso!
- Por que
disse a ela que a injeção ia doer!? Por que foi tão sincero!?
- O mundo
de uma criança na idade dela é muito simbólico; se eu digo a ela que não vai doer,
e na hora de colocar o cateter dói, eu nunca mais vou conseguir dar algum
medicamente a ela, por que ela vai saber que eu menti; agora, se eu digo a
verdade, ela passa a confiar em mim, e eu nela! Crianças são muito sinceras,
isso consequentemente exige que nós também sejamos.
Lisa sem
perceber estava boquiaberta vendo o garoto falar:
- Mais
alguma pergunta?
-
É... Não... Não! Obrigada!
O palhaço
tirou de seu bolso mais um cisne de papel, e ao se despedir de Lisa, deixou em
suas mãos:
- Até
mais!
- Até!
Na mesma
noite, ainda que dona Charlotte tivesse falado que não precisava que o garoto
viesse acompanhar a primeira seção de quimioterapia, o palhaço voltou ao
hospital para estar junto da avó de Lisa:
- Boa
noite dona Charlotte?
- Você
veio!?
- Pois é! (Risos)
Sobrou uma pequena janela em meus horários e acabei vindo! Preparada?
- Sim!
Doga olhou
para Lisa e a cumprimentou:
- Oi Lisa!
- Oi...
- Doga!
(Risos)
- Oi Doga!
(Risos)
- Dona
Charlotte! O procedimento é super rápido! Não precisa se preocupar!
Em seguida
a enfermeira entrou e realizou em dona Charlotte a primeira sessão de
quimioterapia.
No dia
seguinte, por volta das 13h00min, Doga e Tchuco chegam para mais um dia de
distribuição de sorrisos, leito por leito, a dupla espalha alegria por onde
passa; até que chegam no quarto de Lucy e dona Charlotte; a garotinha por conta
da quimioterapia estava dormindo, o palhaço então pergunta para sua mãe Zoe
como ela estava:
- Tudo
bem?
- Indo!
- E Lucy
como está?
- Ela
comeu pouco hoje, e está bem sonolenta!
- É normal
Zoe! O tratamento é bastante pesado! Lucy tem irmãos?
- Não!
- Já
coletaram seu sangue para testes de compatibilidade?
- Já sim!
Meu e do meu marido!
- Então é
aguardar!
- Um
milagre?
- E por
que não?
Zoe
respirou profundamente:
- Vamos
esperar então!
- Vou dar
mais uma volta pelo hospital e depois volto para ver se ela acordou; afinal eu
prometi que iria voltar para vê-la!
- Ok!
Em seguida
o garoto dirigiu-se para o leito de dona Charlotte:
- Boa
tarde dona Charlotte!
- Boa
tarde Doga!
- Como a senhora
se sente?
- Um pouco
fraca, e com enjoos!
- São
alguns dos efeitos colaterais por conta da quimioterapia!
- Logo
passa!
- Com
certeza! Lisa vem para ficar com a senhora?
- Vem sim!
Hoje é dia de estágio e ela chega mais tarde!
- Entendi!
Bom... Vou dar mais uma volta pelo hospital, se a senhora precisar de alguma
coisa!
- Pode
deixar!
O palhaço
saiu para visitar outros leitos. Meia hora depois Lisa chegou para ficar junto
de sua avó, ao entrar no quarto a garota passou pelo leito de Lucy e deu um beijo
na testa da garotinha, em seguida perguntou a Zoe como sua filha estava:
- Como ela
está?
- Sem
muito apetite, e como dá para perceber com muito sono; mas Doga disse que é
normal!
- Ele já
passou por aqui?
- Sim! Há
uma meia hora atrás; mas ele disse que vai voltar para ver se Lucy já acordou!
- Tomara
que sim né!
- Tomara!
Em seguida
Lisa caminhou até o leito de sua avó:
- Oi vó!
Tudo bem?
- A vovó
está um pouco cansada hoje; e às vezes da um pouco de enjoo!
- Em breve
tudo vai melhorar! Quem passou a manhã aqui hoje?
- Seu avô!
Dona
Charlotte olhou para Lisa e deu um pequeno sorriso, Lisa desconfiada retribuiu:
- O que
foi Vó?
- Doga!
- O que
tem o Doga!?
- Ele
gostou de você!
- (Risos)
Que viagem Vó!
- É sério
Lisa!
- Por que
diz isso?
- Ele
perguntou por você quando passou por aqui!
- Oras!
Ele perguntou por que a senhora estava sozinha! Só por isso!
- Vou te
contar uma história Lisa! Antes de encontrar seu avô a vovó já havia namorado
alguns rapazes, mas nada demais, nada dava muito certo por que ainda não era
pessoa certa! Naquela época, o máximo que fazíamos depois de muito custo era
pegar na mão, e namoro sempre em casa, nada de namorado posar em casa de
namorada, sexo antes do casamento? Nem pensar! Nós contávamos os dias da semana
para ir a praça dar uma volta; todos ficavam dando volta ao redor do coreto, os
homens no sentido horário e as mulheres no sentido inverso, parecia um grande
ritual; foi quando eu vi seu avô, a gente sente quando é diferente... Ainda me
lembro como se fosse hoje; ele chegou ao meu lado e perguntou se podia falar
comigo, até parece que eu não ia deixar aquele homem lindo falar comigo;
sentamos em um dos banquinhos da praça e conversamos por horas, aquela era a
melhor conversa que eu estava tendo em toda minha vida; quando a vovó chegou em
casa naquele dia, tinha certeza de uma
coisa: aquele homem seria o pai dos meus filhos; por que estou te contando
isso? Por que essa velha aqui sabe reconhecer um grande amor; e Doga é o seu!
- Que
assim seja Vó!
Minutos
mais tarde Lucy acordou, Zoe deu as boas vindas a filha:
- Oi
princesinha!
- Oi
mamãe!
- Você
dormiu a beça filha! Esta com fome? Quer fazer xixi?
- Não!
Agora não!
- Se
quiser você fala que mamãe te leva!
Zoe e Lucy
ficaram se olhando por alguns minutos, numa sintonia única que só existe entre
mães e filhas, minutos depois Lucy surpreendeu sua mãe:
- Mamãe...?
Eu vou ficar bem?
- Vai sim
filha! Um milagre vai te salvar!
Zoe pegou
o nariz de palhaço que Doga havia dado e colocou na menina. Uma hora depois que
havia passado pelo quarto da pequena Lucy, Doga voltou para ver se a garotinha
já havia acordado, ao entrar no quarto Lucy ficou radiante:
- Doga!
Tchuco!
- Oi Lucy!
- Eu estou
com seu nariz de palhaço!
- Estou
vendo! Você esta linda com ele!
-
Obrigada!
- Eu
prometi que vinha te ver! Esta vendo... Eu vim! Você está bem?
- Sim!
Lisa se
aproximou de Zoe, Lucy e Doga:
- Oi bela
adormecida!
- Oi Lisa!
Doga e
Lisa brincaram mais um pouco com Lucy, e em seguida o garoto perguntou a Lisa
se ela tinha um minuto, a garota disse que sim; Doga se despediu de Lucy e os
dois foram conversar do lado de fora do quarto:
- Lisa...
Queria me desculpar!
- Do que?
- Aquele
dia que veio me perguntar se eu estudava na mesma universidade que você... Tipo...
Nem dei continuidade na conversa direito!
- Imagina
Doga! Você tem seu “trabalho” aqui dentro, eu só perguntei para ter certeza que
era você mesmo!
- Sua avó
me disse que faz estágio!?
- É então!
Meu curso é voltado para o ensino de crianças com autismo, duas vezes por
semana eu passo uma parte da tarde numa instituição de inclusão de crianças
autistas. La eu acompanho junto com uma psicóloga como é feito este tipo de trabalho.
- Deve ser
bem legal!
- É lindo!
Eu trabalho com três menininhos: Gary, Richard, Mathew!
- Seus
anjinhos!?
- Sim!
- Temos
bastante coisas em comum! Você também é apaixonada por crianças!
- Pra você
ver! (Risos)
- Eu
também gosto bastante de crianças! São elas que fazem eu acordar todos os dias
e ter forças para vir para cá! Eu sinto meu coração bater forte aqui dentro,
esse lugar é mágico Lisa... Todos os dias eu vejo milagres acontecer diante dos
meus olhos.
- Seus
olhos até brilham!
- Eu gosto
demais desse lugar!
- Se você
não me fala nem percebo! (Risos)
- (Risos)
Foi um prazer Lisa!
- O prazer
foi meu...
- Doga! (Risos)
- Sem essa
vai! Doga é o palhaço, quero saber o nome de quem dá vida a ele!
- Então
sinto muito, mas você vai ter que me encontrar fora daqui! Dentro deste
hospital eu sou o Doga! (Risos)
Lisa
brincou com Doga:
- Tudo
bem! Eu nem queria mesmo saber seu nome! (Risos)
- A gente
pode... De repente sair para... Tomar um café!
- Se você
tiver outra janela em sua agenda super lotada, pode ser amanhã!
- Fechado!
No dia
seguinte dona Melanie foi fazer companhia para sua mãe, Lisa e o até então
palhaço Doga, puderam tomar o café que o garoto havia proposto, os dois foram
ao Soul’s Café, bem em frente ao Hospital Saint Louis, ao vê-lo Lisa brincou
com o garoto:
- Te ver
assim é quase como ver o Peter Parker sem a fantasia de homem aranha! (Risos)
- Onde
estará a Mary Jane?
Em seguida
Lisa e o garoto entraram no Soul’s Café e se acomodaram. A garota:
- O que
vai tomar?
- Sempre
que venho aqui tomo café com leite condensado! E você?
- Tanto
faz, nunca vim aqui! (Risos)
O garoto
acenou para a garçonete que veio até ele:
- Por
gentileza dois cafés com leite condensado!
Lisa olhou
para o garoto e sorriu:
- Fim do
jogo! Não estamos mais dentro do hospital! Seu nome!
- Sorria
de novo?
- Por quê?
- Sorria
de novo?
- Não me
engambele Doga! (Risos)
- Eu falo
meu nome e você sorri de novo! Fechado?
- Nome!
- Carlton!
- Carlton?
Belo nome!
- Muito
obrigado! Sorria de novo?
Lisa
soltou um sorriso para Carlton:
- Você tem
covinhas nas bochechas?
- Ai meu
Deus, só minha mãe e minha amiga Kate já tinham percebido minhas covinhas...
Não vai ficar me zuando né? (Risos)
- Pelo
contrário, elas deixam você ainda mais bela!
Lisa ficou
envergonhada; Carlton concluiu:
-
Principalmente quando ficam vermelhas!
O
sofrimento da avó de Lisa a humanizou bastante, não que ela nunca tenha sido
humana, não é isso, mas Lisa começou a ver uma nova possibilidade de deixar-se
apaixonar novamente, desta vez sem medos. Depois de muito conversarem Lisa
ainda desconfiada abaixou a guarda:
- Carlton!?
Por que será que eu estou me sentindo a pessoa mais protegida do mundo ao seu
lado?
- Eu
também não sei, mas podemos descobrir juntos!
- Eu não
sou uma pessoa legal para você se apaixonar... Vai por mim, eu não sou! Você
corre um grande risco em se apaixonar por mim!
- Estou
disposto a correr riscos!
- Tem certeza?
- Absoluta!
Depois que alguns de meus relacionamentos não deram certo, eu prometi a mim
mesmo que jamais iria me apaixonar novamente! Confesso que cometi um erro, eu
subestimei meus sentimentos e por regra não costumo fazer isso!
Lisa e
Carlton se aproximaram e acabaram se beijando.
Uma semana
depois, Doga voltou ao hospital para mais um dia de peregrinação, ao entrar no
quarto de Lucy, Doga fingiu bater a cara na porta:
- Tchuco!
Você nem para me avisar que a porta estava fechada!
- “Eu
pensei que você tinha visto Doga cabeção!”
Lucy
soltou uma grande gargalhada, depois chamou pelo palhaço:
- Doga!
- Oi
princesinha! Fala oi Tchuco! Seu mal educado! (Risos)
- “Oi
Lucy”!
- Oi
Tchuco!
Doga se
aproximou do leito de Lucy, e a pequena deu-lhe um grande abraço:
- Como você
passou a semana?
- Bem! A mamãe
me ensinou a cantar uma música!
- A é?
Qual música?
- A do
peixe vivo! Você conhece?
- Eu acho
que sim!
- Canta
comigo?
- Claro!
- Eba!
Como pode um peixe vivo viver fora da água
fria?
Como pode um peixe vivo viver fora da água
fria?
Não há pranto sem saudade, nem amor sem
alegria.
É por isso que eu reclamo essa tua
companhia.
É por isso que eu reclamo essa tua
companhia.
Como poderei viver?
Como poderei viver?
Sem a tua, sem a tua, sem a tua companhia.
É por isso que eu reclamo essa tua
companhia.
Sem a tua, sem a tua, sem a tua companhia.
É por isso que eu reclamo essa tua
companhia.
Lucy ficou
extremamente feliz:
- Obrigada
Doga!
- Não
precisa me agradecer Lucy! Vou te ensinar como palhaços dizem tchau! Coloca seu
nariz de palhaço!
Lucy
atendeu prontamente o pedido de Doga, em seguida o palhaço encostou seu nariz
no nariz da pequena e começou a esfregar! Lucy começou a rir, o garoto fez
algumas cosquinhas na garotinha e ela ria ainda mais, até que sua risada
começou a contagiar a todos, Zoe começou a rir, dona Charlotte e Lisa também,
até que todos estavam rindo. O garoto deixou a centopeia com Lucy, fez um afago
em Zoe, e foi até o leito da avó de Lisa:
- Oi dona
Charlotte!
- Oi Doga!
- Oi Lisa!
- Oi Carlton!
Ops... Oi Doga!
O garoto
sorriu, e voltou-se para a avó da garota:
- Como a
senhora passou a semana?
- Bem! Os
enjoos passaram... Por pouco tempo!
- Hoje a
noite tem uma nova sessão de quimioterapia?
- Sim...!
Depois de
um breve silêncio dona Charlotte surpreendeu o palhaço:
- Doga...
Olha para mim!
- Diga!
- Eu vou
perder os cabelos?
O garoto
olhou para Lisa e abaixou a cabeça; segundos depois encheu os pulmões de ar e
disse:
-
Infelizmente sim!
A avó de
Lisa ficou visivelmente abalada com a notícia, ela tinha esperanças que talvez
não fosse preciso raspar os cabelos. Em seguida Lisa olhou para Lucy brincando
com Tchuco. Ao olhar para Doga, antes mesmo de perguntar, o garoto com os olhos
cheio de lágrimas respondeu:
- Ela
também!
Não seria
a primeira vez que o palhaço ia ver uma criança careca; todos os dias Doga via
crianças que por conta do tratamento raspavam suas cabeças, mas Lucy tinha algo
de especial, algo que mexia com ele emocionalmente; e ainda que o garoto
soubesse que era só uma questão de tempo para que isso viesse a acontecer, Doga
não queria admitir.
Uma semana
depois, ao sair do estágio, Lisa correu para o hospital para ficar junto a sua
avó, ao adentrar o quarto, depois de dar um beijo em Lucy e Zoe, a garota levou
o primeiro duro golpe emocional, haviam raspado os cabelos de sua avó.
Duas
coisas podem ser consideradas a alma de uma mulher, primeiro os seios, depois
os cabelos.
Lisa não
conseguiu disfarçar a emoção ao ver dona Charlotte; com lágrimas nos olhos a
garota gaguejou:
- Oi Vó!
- Oi Lisa!
- Quando
rasparam?
- Hoje
pela manhã! Já estava começando a cair, eles acharam melhor raspar.
- Quem
estava aqui?
- Meu
príncipe encantado e sua mãe!
- E esse
lenço? Quem deu? Meu avô príncipe encantado!?
- Sim! Ele
mesmo colocou em mim! Por que está chorando Lisa?
- Não...
Nada Vó!
Mesmo com
todos os obstáculos que a vida lhe reservara, dona Charlotte seguia dando um
valor absurdo em sua vida, exalando otimismo em cada célula de seu corpo.
Mais um
dia da luta de Lucy pela vida; para passar o tempo a pequena pediu uma caixa de
lápis de cor e algumas canetinhas para desenhar, minutos depois a garotinha
entregou o desenho para sua mãe:
- Tome
mamãe!
Ao ver o
desenho Zoe ficou extremamente emocionada, a pequena Lucy havia desenhado seu
pai, sua mãe, Doga, Tchuco, Lisa, dona Charlotte, e ao centro da folha Ela...
Já sem os cabelos.
Se Lisa
assustou-se ao ver sua avó, com Doga não foi diferente, ao adentrar o quarto, o
palhaço foi sacudido com a imagem de dona Charlotte de lenço na cabeça; logo a
atenção do garoto foi desviada pela vozinha doce da pequena Lucy:
- Doga!
Doga! Doga! Olha o desenho que eu fiz para você!
- Me deixe
ver!
Ao pegar o
desenho, o palhaço viu que Zoe estava emocionada.
Doga ainda
se recuperava da imagem da avó de Lisa quando foi novamente surpreendido com o
desenho da pequena Lucy. Ainda que não tivesse cortado os cabelos, a garotinha
já se desenhava sem eles. Doga recuperou-se, enxugou as lágrimas dos olhos de
Zoe e pediu para que Lucy explicasse o desenho:
- Quem são
Lucy?
- Meu pai,
minha mãe, você, Tchuco, Lisa, a dona Charlotte, e eu!
- E está
faltando alguma coisa em você?
- Não!
Doga
depois de um breve silêncio retomou:
- Lucy! Se
lembra dos vagalumes?
- Sim!
- Se
lembra do remedinho que falei que precisava tomar? A poção mágica?
- Para a
lusinha no bumbum voltar a brilhar?
- Isso!
- Eu
lembro!
- Deixa eu
contar uma coisa! Aquele remedinho vai fazer com que alguns fios do seu lindo
cabelo caia, então... Seria melhor...
O garoto
começou a chorar; Lisa, dona Charlotte e Zoe também, Lucy questionou o palhaço:
- Por que
está chorando Doga?
- Eu estou
chorando de alegria de saber que você existe Lucy! De estar olhando para você!
E de ver o quanto você é especial!
Doga respirou fundo e retomou o diálogo:
- Quanto a
seu cabelo Lucy! Seria melhor a gente cortar! O que acha?
- Que nem
dona Charlotte?
- Isso!
Que nem a dona Charlotte!
A avó de
Lisa percebendo o quão difícil estava sendo aquele momento, tomou a liberdade
de entrar na conversa:
- Sabe o
que é Lucy? As vezes é preciso cortar os cabelos para nascer outros ainda mais
bonito!
A garota
sorrindo respondeu:
- Está
bem! Eu corto!
Doga
concluiu:
- Eu vou
estar com você!
Lucy
encheu o quarto de luz e esperança naquela tarde, em nenhum momento a pequena
chorou. Minutos depois uma enfermeira entrou para medicar a garotinha, Doga
cochichou com ela:
- Quando
vão cortar os cabelos dela?
-
Provavelmente no fim da tarde!
- Eu quero
estar junto, posso?
- Claro!
Em seguida
o palhaço despediu-se de Lucy e prometeu voltar; Doga avisou Zoe que iriam
cortar os cabelos dela no fim da tarde, o garoto então se aproximou de dona Charlotte
e Lisa:
- Obrigado
pela ajuda com a Lucy!
- Obrigado
você por ter me proporcionado ver uma das cenas mais bonitas da minha vida!
- Imagina!
A senhora ficou linda com esse lenço!
- Foi meu
marido que escolheu!
- Ele tem
ótimo gosto! A senhora está bem?
- Depois
do que acabei de ver... Estou ótima!
- Se
importa se eu levar sua neta por alguns minutos no final da tarde?
- De
maneira nenhuma!
Lisa
sorriu:
- Aonde vamos?
- Apenas
confie em mim! Passo aqui no fim da tarde para te pegar!
- Ok!
No fim da
tarde, conforme havia prometido, Doga voltou ao hospital; ainda no corredor o
palhaço encontrou a enfermeira da qual ele havia conversado algumas horas
antes:
- Já
levaram a Lucy?
- Estamos
indo buscá-la!
- Deixa
que eu vou!
- Tudo
bem, vou preparar a sala!
Doga
entrou no quarto brincando:
- É aqui
que mora a garotinha mais linda do hospital Saint Louis?
- Doga!
- Tudo
bem?
- Sim...!
Doga este é meu pai! Ele saiu do serviço só para vir me ver!
- Que
legal!
O palhaço
se apresentou:
- Prazer
Doga!
- Prazer
Damon!
O palhaço
olhou para Lisa:
-
Preparada?
- Sim!
- Então
vamos!
- Lucy! Eu
vim te buscar para cortar os cabelos!
- Tudo
bem! Voce vai comigo?
- Todos
nós vamos! Sua mae, seu pai, eu e a Lisa!
- Eba!
Todos se
encaminharam para a sala onde os cabelos da pequena Lucy iriam ser cortados,
assim que chegou a garotinha sentou na cadeira, Doga colocou o nariz de palhaço
nela:
- Lucy...
Vai ser bem rápido!
- Você vai
ficar aqui comigo?
- Vou
estar sentado aqui do lado! Eu prometo!
Na
antessala, através de um vidro, o pai de Lucy, sua mae e Lisa acompanhavam tudo
que estava acontecendo.
A
enfermeira ligou a maquininha e lentamente começou a varrer os cabelos da
pequena Lucy, cacho por cacho os cabelos da garotinha caiam no chão, do lado de
fora, olhando pelo vidro, Damon e Zoe abraçados choravam compulsivamente, Lisa
por sua vez também, Doga tentou segurar o máximo que podia, mas foi vencido
pela emoção de ver os cabelos de Lucy serem cortados, e acabou desabando em
lagrimas também. Tudo parecia um filme em Slow Motion, cada movimento, cada fio
de cabelo, tudo se movia como se o tempo não existisse.
Assim que
a enfermeira desligou a maquininha, Lucy passou a mão em sua cabeça... Não
falou nada, apenas chorou... Doga ajoelhou-se diante de Lucy e a consolou com
um grande abraço:
- Está
tudo bem! Vai ficar tudo bem! Eu estou aqui!
- Eu te
amo Doga!
- Eu também te amo Lucy...! Agora sente-se
ali! É minha vez!
Doga
sentou-se na cadeira onde Lucy estava sentada, e surpreendendo a todos sem
titubear pediu:
- Por
favor enfermeira! Raspe a minha cabeça também!?
Do lado de
fora todos ficaram sem entender; a enfermeira atendeu ao pedido do garoto;
religou a maquininha e repetiu o gesto que havia feito em Lucy. Doga brincou
com Lucy:
- Que
legal Lucy...! Nós estamos carecas!
A
garotinha sorriu. Agora Doga e Lucy estão iguais...
Ao sair da
sala a pequena Lucy foi amparada por seus pais, e Doga por um beijo caloroso de
Lisa.
Mais um
dia na vida de Carlton, o garoto que dá vida ao palhaço Doga; Carlton passou a
manhã toda dobrando origamis de papel, a tarde ele foi para o hospital para
mais um dia de distribuição de sorrisos, ao entrar no quarto de Lucy e Dona
Charlotte o garoto avistou a avó de Lisa dormindo, sentada em uma cadeira e
debruçada aos seus pés, Lisa também dormia. Lucy havia recebido a terceira
sessão de quimioterapia e estava bem quietinha, Doga com um lindo sorriso se
aproximou dela:
- Como vai
minha carequinha?
Falando
bem baixinho a garota respondeu:
- Bem!
Zoe olhou
para Doga e começou a chorar:
- Me dói
tanto o coração ver ela deste jeito, ela é tão pequenininha, tão pura, tão
frágil! Por que ela? Por que não eu?
- Zoe...
Olha para mim! Você acredita em Deus?
- É claro!
- Sua
filha é morada dele! Tenha fé... Tenha fé!
Lucy
chamou pelo palhaço:
- Doga?
- Oi!
- A mamãe
falou que um milagre vai me curar!
- A mamãe
esta certa!
- Eu vou
ficar bem Doga?
- Tenho
certeza que sim! Bom... Eu preciso ir!
Doga passou
pelo leito de dona Charlotte, e cuidadosamente deixou um envelope ao lado de
Lisa.
Ao
acordar, Lisa viu o envelope ao seu lado, ainda sonolenta abriu para ver o
havia dentro, primeiro Lisa encontrou uma espécie de manual de instruções:
Oi
Lisa! Tudo bem?
Você
acaba de receber um “Kit felicidade”.
Se eu
estiver certo, neste momento você deve estar se perguntando:
Que
maluco seria capaz de me mandar um envelope com pássaros e cisnes feitos de
origami?
Resposta:
Um maluco que quer ver você cada dia mais feliz.
Vamos
aos itens do Kit:
Quatro
Pássaros.
Um
Cisne.
Uma
Rosa.
Um
Pen Drive.
Os
pássaros são uma fonte de alegria constante; as pessoas que oferecem pássaros
feitos de origami terão felicidade em abundância. Conta uma lenda que quem
fizer mil origamis alcança uma graça, se for verdade ainda faltam uns
oitocentos para mim. (Risos)
É o
seguinte Lisa, gostaria que você oferecesse três desses pássaros a três anjos
em especial, você deve saber de quem estou falando:
Gary.
Richard.
Mathew.
Eu
sei que eles são pequenininhos e provavelmente vão rasgar tudo, mas o
importante é o significado de oferecer os pássaros.
O
cisne adivinha? É seu! (Risos)
A
rosa feita de papel? Também é sua! (Risos)
O
pássaro que restou você oferece para uma pessoa especial... Quem você quiser!
O que
esta faltando mesmo?
Ah
claro! O pen drive! (Risos)
Bom...
Sem comentários em relação ao pen drive, apenas abra e assista o que tem
dentro.
Que
tal tomarmos um café a noite no Soul’s?
Com
carinho
Doga
Lisa
rapidamente pegou o notebook que estava em sua mochila e ainda no hospital a
garota foi assistir ao conteúdo que havia no pen drive.
Lisa ficou
encantada com a menininha no vídeo.
A noite
Lisa e Carlton foram ao Soul’s, a garota agradeceu pelo envelope com os
pássaros:
- Obrigado
pelo envelope!
- Gostou?
- Amei! A
loirinha do vídeo... É linda!
- Tanto
quanto a Lucy!
- Falando
nela... Ainda não tive a oportunidade de perguntar isso! Por que raspou a
cabeça também?
- Me
partiu o coração ver ela passando a mão na cabeça procurando pelos cabelos,
achei que ficando igual a ela poderia deixa-la mais feliz!
- Mais uma
vez você estava certo!
- A gente
faz o que está ao nosso alcance!
- Eu acho
que você já fez muito mais do que está ao seu alcance!
- Será?
Sempre há algo mais a fazer!
- Juro que
se eu pudesse eu salvava a vida dela!
- Quem
sabe!
- Mais uma
pergunta Carlton! Quando você promete para as pessoas que elas vão ficar bem...
Não me interprete mal, mas... Você acredita nisso?
Carlton
abaixou a cabeça e segundos depois ao se levantar seus olhos estavam marejados de
lágrimas:
- Eu
acredito! Isso se chama FÉ! Mesmo com 99% de chances de dar errado, as pessoas querem
ouvir 1% de chance de que vai dar certo. A única coisa que as pessoas querem de
mim, é que eu acredite na cura delas, por que às vezes nem elas mesmas acreditam.
Lisa
abaixou a cabeça:
-Eu queria
ser mais forte Carlton! Eu só queria ser mais forte!
Carlton
colocou seu dedo indicador embaixo do queixo de Lisa e levantou para que a
garota olhasse dentro de seus olhos:
- Olha pra
mim! Não acha que está se cobrando demais...? Carregar o peso emocional de toda
família é um fardo pesado demais não acha?
Lisa
abraçou Carlton e em seu ombro desabou em lágrimas, a camiseta do garoto chegou
a ficar molhada.
Depois de
seu desabafo Lisa se aproximou de Carlton e os dois voltaram a se beijar, a
garota brincando se mostrou inconformada por ter encontrado Carlton somente
agora:
- Fala pra
mim? Onde você estava todo este tempo? Por que não apareceu na minha vida
antes?
- Por que
o destino convergiu para que fosse agora!
Uma semana
depois, os exames de compatibilidade que os parentes de Dona Charlotte e os
pais de Lucy haviam feito, ficaram prontos, o doutor reuniu todos para a
divulgação dos resultados, inclusive os pais de Lucy:
- Boa tarde
a todos, eu reuni todos aqui para a divulgação dos resultados dos exames de
compatibilidade das pacientes Lucy e Charlotte! Logo mais vocês vão entender
por que chamei também os pais de Lucy para estarem aqui! Antes de divulgar os
resultados eu queria dizer que independente de serem ou não compatíveis, não
percam as esperanças, essa é só mais uma batalha, perdida essa, inicia-se
outra...! Bom, vamos aos resultados!
O médico
Karl abriu os envelopes e leu um por um para não cometer erros e dar falsas esperanças,
assim que leu o último envelope o médico sorrateiramente soltou um sorriso:
- Pessoal!
Todos os exames realizados nos parentes de Dona Charlotte... Deram
incompatíveis, nenhum de vocês é compatível com dona Charlotte...
Senhor
Sebastian entrou em desespero, dona Melanie e algumas tias de Lisa começaram a
chorar; Lisa abraçou Doga e também começou a chorar, enquanto isso os pais da
pequena Lucy tentavam confortar os parentes de dona Charlotte.
O doutor Karl
retomou:
- Eu sinto
muito...! No entanto tivemos uma grande surpresa ao colocar os resultados dos
exames de vocês no banco de dados, Lisa embora seja incompatível com dona
Charlotte, é 99,9% compatível com a paciente Lucy!
Os pais da
garotinha ficaram emocionados.
Doga olhou
para Lisa:
- Deus as
vezes faz milagres na vida de algumas pessoas, outras vezes, escolhe outras
pessoas para fazer milagres em nossa vida! Acho que chegou sua hora Lisa!
Lisa se
aproximou dos pais de Lucy e anunciou o que todos já esperavam:
- Zoe...
Damon...! Eu vou salvar a vida da Lucy!
- Lisa
muito obrigado! Espero do fundo do meu coração que apareça um doador que seja
compatível com sua avó!
- Vai
aparecer! Eu tenho Fé que vai!
Na sala de
espera do hospital Saint Louis, os sentimentos de tristeza e alegria se misturaram.
Era o fim de uma batalha árdua na vida da pequena Lucy, e o início de uma nova
batalha na vida de Dona Charlotte. Doga amparou Lisa em seus braços:
- Lisa!?
Tudo vai dar certo!
- Se fosse
outra pessoa talvez eu não acreditasse! Mas vindo de você, não tem porque eu
temer!
Algumas
horas depois a família de dona Charlotte foi sacudida por uma nova notícia; uma
reunião de emergência foi marcada para o doutor Karl anunciar o que havia de
novo:
- Desculpe
ter chamado vocês as pressas para estarem aqui! Quando eu disse que aquela era
apenas mais uma batalha, e que era para vocês não perderem as esperanças, é por
este motivo que eu falava! Surgiu um doador 97,6% compatível com dona
Charlotte!
Todos na
sala comemoraram a notícia, Lisa ficou eufórica:
- Quem é o
doador doutor? Quem é?
- Carlton Malbone!
Lisa ficou
surpresa e começou a chorar, para todos ali, Doga era um simples palhaço que
transformava dias escuros em dias claros, somente Lisa sabia a “identidade
secreta” de Doga.
Lisa saiu
correndo pelos corredores do hospital para ir ao encontro de Doga, ao dobrar um
dos corredores a garota deu de topa com o palhaço:
- Ei...
Aonde você vai com tanta pressa!
Vendo que
era Doga, Lisa o abraçou fortemente:
- Eu te
amo Carlton! Eu te amo muito!
- Eu
também Lisa! Desde a primeira vez que te vi!
- Sua
medula é compatível com a da minha avó!
- Que
ótima notícia Lisa!
- Muito
obrigado Carlton! Você fez eu voltar a viver! Esteve comigo sempre! Me fez
acreditar em milagres...!
- Durante
dois anos, eu vi muitos milagres acontecer aqui dentro Lisa, mas eu nunca imaginei
que um dia seria o próprio milagre!
- Somos
dois milagres Carlton! Uma pequena parte nossa vai devolver a vida a duas
pessoas!
Carlton e
Lisa correram para o quarto para dar a noticia; Carlton foi falar com dona
Charlotte, enquanto Lisa foi falar com Lucy:
- Lucy!
- Oi Lisa!
Por que está chorando?
- Lucy...
Lembra de quando a mamãe disse que um milagre iria te salvar?
- Sim! Me
lembro!
- O
milagre sou eu Lucy! A lusinha no bumbum do vagalume vai voltar a brilhar... Eu
vou salvar a sua vida!
- Eba! Eba!
Eba!
As duas se
abraçaram:
- Eu te
amo Lucy!
- Eu
também te amo Lisa!
Em seguida
foi a vez de Carlton dar a notícia a avó de Lisa:
- Dona
Charlotte... A senhora acredita em milagres!?
- Depois
que te conheci passei a acreditar ainda mais!
- Sua Fé
te salvou! Eu sou compatível com a senhora... Eu vou salvar a sua vida dona
Charlotte!
- Vai
parecer muito estranho o que vou te falar... Mas eu já sabia disso! Eu tive um
sonho na noite passada, e nele você salvava a minha vida!
- Realmente
é um milagre!
No dia
seguinte foi realizado o procedimento de coleta da medula óssea de Carlton e
Lisa, em seguida transplantada na pequena Lucy e dona Charlotte.
Alguns
meses depois...
Lisa e
Carlton agora são namorados, a garota depois de toda experiência vivida com sua
avó e a pequena Lucy, se juntou a Carlton, Lisa agora é a palhaça Dedé.
Lucy
graças a Lisa agora esbanja de boa saúde, os cabelos voltaram a crescer, e a
pele da garotinha está corada de novo. Lisa e Carlton a visitam com frequência.
A avó de
Lisa? Tem gás para viver mais uns 200 anos, dona Charlotte assim como Lucy,
goza de boa saúde, coitado do senhor Sebastian que a acompanha pelos bailes da
Brilhantina. (Risos).
Como eu
sei que Carlton é o grande amor da vida de Lisa? Eu não sei, ela também não
sabe, eu só sei que cada relacionamento é um relacionamento, e não podemos
desperdiçar as chances que o destino nos dá.
The End