quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Dê valor aos privilégios ocupacionais

A vida de terapeuta é uma vida de entrega na qual transcendemos diariamente nossos desejos pessoais e voltamos nosso olhar para as necessidades e crescimento do outro. Obtemos prazer não apenas pelo crescimento do nosso paciente, mas também pelo efeito da reverberação – a influência salutar que nosso paciente tem sobre aqueles com quem eles têm contato em suas vidas.
Há um privilégio extraordinário nisso. E uma satisfação extraordinária, também.
Somos guardiões de segredos. Todos os dias pacientes nos honram com seus segredos, freqüentemente nunca antes compartilhados. Receber tais segredos é um privilégio concedido a bem poucos.
Algumas vezes os segredos me chamuscam, pulsam dentro de mim e despertam minhas próprias memórias e impulso fugidios, há muito esquecidos. Outros, ainda, me entristecem quando sou testemunha de toda uma vida que pode ser desnecessariamente consumida pela vergonha e incapacidade de se perdoar.
Nós terapeutas carregamos o fardo de segredos dolorosos de culpa por atos cometidos, vergonha de não ter agido, anseio de ser amados e apreciados, vulnerabilidade profunda, inseguranças e medos.
Ser um guardião de segredo tornou-me, com o passar dos anos, mais gentil e tolerante. Quando encontro indivíduos inflados de vaidade ou presunção, ou que se distraem por qualquer uma de uma infinidade de paixões devoradoras, eu intuo a dor de seus segredos profundos e não faço um juízo, mas sinto compaixão e, acima de tudo conectividade.
De mãos dadas com os pacientes, saboreamos o prazer das grandes descobertas -  a experiência do “arrá!” – quando fragmentos ideacionais discrepantes subitamente deslizam suavemente, unindo-se com coerência.
Eu sempre costumo fazer uma analogia sobre o que é ser terapeuta.
O paciente que chega até nós, traz consigo uma caixa com milhares de peças de um gigantesco quebra cabeça, nós como terapeutas temos a missão de organizar e montar este quebra cabeça, mas não é fácil. Quem ja montou pelo menos um quebra cabeça na vida sabe: sempre deve-se começar a montar pelas extremidades.
A cada dia uma nova peça é encaixada e o quebra cabeça vai ganhando formas cada vez mais claras, porém ocorre alguns sacrifícios, você vai percebendo que algumas peças não pertencem aquele quebra cabeça, mais que isso, estão faltando algumas peças.
Com muito cautela e a duras perdas o seu paciente vai entregando as peças que estavam sorrateiramente escondidas, e com isso o enorme quebra-cabeça que antes parecia impossível montar, agora ganha vida; você acaba de encaixar a ultima peça.
É o fim?
Não!
Você olha para a mesa e vê que as peças que sobraram deste quebra cabeça que você acabará de montar, na verdade formam um novo quebra cabeça.
Let's Go Again!? (Risos).
Por fim, sempre considerei um privilegio extraordinário pertencer a venerável e honrada agremiação dos que curam, e ocupam seu tempo a fim de cuidar do desespero humano.

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