sábado, 13 de agosto de 2011

Amor Líquido


Um relacionamento precisa de uma coisa: cumplicidade. Se um não está disposto a defender o outro ao custo do seu próprio bem-estar, se não está disposto a permanecer junto nos momentos de necessidade, mesmo que prefira estar em outro lugar, ou mesmo que seja perigoso ficar junto, então não há cumplicidade. E o que vemos nos relacionamentos modernos é um atacando e acusando o outro, mesmo que de "brincadeira", o tempo todo. Um querendo manipular o outro. Um abandonando o outro na primeira chance que tem de obter mais prazer em outro lugar. Isso também fragiliza os relacionamentos, porque ambos fazem uma espécie de pacto de não-cumplicidade (cada um faz o que quiser sem precisar se limitar pelo outro), e aí depois ficam reclamando que não são compatíveis, que o amor acabou, que há brigas, ciúmes, traições. Oras, não há como haver compatibilidade nem confiança sem cumplicidade. Se você não sabe se o seu parceiro vai te delatar para seu inimigo na primeira chance que tiver, como confiar nele?
E cumplicidade não é fechar-se num ciúme doentio, mesmo que mútuo ou socialmente aceitável, onde cada um cria obstáculos para impedir o outro de se relacionar com outras pessoas. Infelizmente, muitos dos relacionamentos afetivos e amizades que duram muitos anos se mantém com base nessa espécie de invólucro hermeticamente fechado ou sociedade secreta, em que todo elemento estranho que se aproxime demais começa a ameaçar a paz e a saúde do relacionamento. Isso revela a mentira, e nenhum relacionamento baseado na mentira e na ausência de liberdade é sustentável, por mais que possa se arrastar por anos.
Portanto, para valorizar a sustentabilidade de um relacionamento, não adianta tentar manter a durabilidade a qualquer custo. Tanto no relacionamento sem liberdade quanto no relacionamento vago e solto demais, o que falta é cumplicidade.
No meu terceiro ano de faculdade uma das matérias do curso tinha como objetivo observar alguns fenômenos do nosso cotidiano.
Eu escolhi observar a fragilidade dos relacionamentos; para embasar minhas observações e elaborar meus relatórios o professor da disciplina orientou-nos estar lendo um livro do tema escolhido. Escolhi ler um livro de um sociólogo chamado Zygmunt Bauman, o livro chama-se amor líquido, o escritor tem vários livros com o termo líquido, medo líquido, vida líquido, tempos líquido.
Neste livro, o autor investiga de que forma as relações parecem tornar-se cada vez mais 'flexíveis', gerando níveis de insegurança maiores. Segundo Bauman, a prioridade a relacionamentos em 'redes', as quais podem ser tecidas ou desmanchadas com igual facilidade e frequentemente sem que isso envolva nenhum contato além do virtual, faz com que as pessoas não saibam mais manter laços a longo prazo. Esta obra procura alertar que não apenas as relações amorosas e os vínculos familiares são afetados, mas também a capacidade de tratar um estranho com humanidade é prejudicada.
Em um dos capítulos do livro intitulado "Apaixonar-se e Desapaixonar-se" o sociólogo discorre a facilidade com que se apegamos as pessoas e a velocidade que elas se tornam descartáveis.
Talvez estamos passando por um momento em que não existe uma tentativa de se fazer dar certo, as pessoas se envolvem já pensando na possibilidade de não dar certo, e se isso vier a acontecer ela simplesmente procura outra, simples assim.
Fazia parte da disciplina uma carga horária de 40 horas para observação do fenômeno escolhido. Fiz estágio em uma instituição e em uma de minhas visitas fiquei por algumas horas conversando com um adolescente que acabara de iniciar um relacionamento com uma adolescente um ano mais nova que ele. Conversamos por algumas horas e o mais barato nisso tudo é como as pessoas querem certezas que vai dar certo, ele me falava:
- Mas Lucas! Se ao menos eu soubesse o que ela sente! Eu poderia de repente ter uma postura um pouco diferente da que eu estou tendo. Eu preciso saber o que ela sente por mim.
É interessante observar a preocupação do garoto, por que no fundo, esta é a preocupação de todo ser humano, independente da idade, nos queremos prever o que vai acontecer, queremos certezas.
O mais triste nisso tudo é que a busca por estas certezas as vezes acabam por destruir ou atrapalhar um relacionamento que talvez daria certo. Sabe com eu sei disso?
Dias depois conversei com a namorada do rapaz; é curioso por que os mesmos medos e insegurança dele, eram também os dela.
Era visível na garota a alegria de estar sentindo aquele sentimento que ninguém nunca conseguiu explicar. Ela me disse:
- No dia em que a gente se beijou pela primeira vez Lucas... Foi mágico! Parecia que não tinha nada dentro de mim, além de um casal de vaga-lumes bem serelepes (Risos). O mais próximo de uma explicação para aquele momento era minha pele toda arrepiada, e um gelo que subia das pontas dos meus pés até minhas vértebras.
Eu nunca tinha ouvido com tanta clareza e riqueza de detalhes um "primeiro beijo" como ouvi daquela jovem naquela tarde, dizem que alguns sentimentos não tem explicação, eu ousaria dizer que ela foi uma das pessoas que havia chego mais perto de explicar um sentimento.
Continuamos conversando, e ela falou que o olhar deles não é um olhar comum, é um olhar que perpassa, é um olhar além, através.
Depois de conversarmos por longas horas, ela me fez a única pergunta que eu gostaria que ela não fizesse:
O que é isso que eu to sentindo?
Eu estava fugindo desta pergunta por que o professor da disciplina e também coordenador do curso, orientou-nos a não se comprometer emocionalmente com nenhum dos fenômenos observados, até mesmo porque estávamos no 6º semestre,  porém eu não podia ficar sem dar uma resposta para adolescente, e também não podia correr o risco de... de repente acabar com tudo de bom que ela estava sentindo, então o que fazer?
Depois de muito pensar eu respondi à adolescente que se o que ela esta sentindo tivesse explicação ela deixaria de sentir, certas coisas na vida só são interessantes por que não tem explicação, a partir do momento que você encontra explicação ela deixa de ser interessante ou deixa de fazer sentido. Eu acho que esse é o grande barato do amor, ele não tem explicação, ele simplesmente é! Ponto.
Eu acho que há uma busca das pessoas em dar nome aos seus sentimentos, como se dando nome significasse ter controle sobre eles.
O mundo é daqueles que se arriscam, daqueles que se entregam, e daqueles que se permitem ser tocados independente dos riscos envolvidos, por isso acabo mais uma postagem citando "Tempos Modernos" de Lulu Santos.

Vamos viver tudo que há pra viver...
Vamos nos permitir

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